sexta-feira, 20 de junho de 2008

A outra imigração japonesa

Enquanto a imigração japonesa no Brasil comemora 100 anos, uma tribo no mínimo diferente ainda comemora 14 anos de uma outra imigração japonesa, a do mangá.

Por Thiago Borges

O desembarque

Neste ano de 2008 faz 100 anos da imigração japonesa no Brasil. A festa é comemorada por todos, nisseis, sanseis, brasileiros descendentes ou não. Afinal de contas é impossível não agradecer pela chegada de uma cultura tão rica e bela como é a cultura japonesa em nosso país. O contagio é geral e todos são convidados a celebração, portanto, não se assuste quando estiver passeando pelo bairro da Liberdade em São Pulo e se deparar no meio do festejo com uma centena de rostos adolescentes que em nada se assemelham as feições orientais. Garotos com espinhas no rosto, vestindo roupas estranhas e com uma dúzia de livrinhos com capas coloridas em baixo dos braços. Mantenha a calma, respire, não é o dia das bruxas, você apenas encontrou alguns otakus.

“Mas que diabos é otaku?” Calma, Trata-se de alguém, independente da idade, que é fascinado por praticamente tudo o que vem do Japão, principalmente o mangá, que é o quadrinho japonês, e o anime, que é o desenho que passa na TV. Mas no Brasil esta ainda é uma cultura recente.

Tudo teve inicio em meados de agosto de 1994 na extinta rede manchete. Um novo desenho começava a ser exibido na emissora, “Os Cavaleiros do Zodíaco” era o seu titulo e pouca gente imaginou que eles causariam tamanha explosão no mercado e na cabeça da criançada. A nova empreitada da manchete, que inclusive já tinha uma recente historia com series tokusatsus japonesas (series com atores reais, Jaspion, changeman, Jiraya), agora entrava no segmento de animação, o animê. O sucesso foi enorme e não demorou muito para que surgissem outros desenhos do mesmo gênero acompanhando a nova febre da televisão brasileira.



Mangá? Da pra explicar direito?

Ok, titio explica. O universo da animação japonesa é muito grande, uma verdadeira industria. Por isso não há como falar desta cultura sem antes entender um pouco sobre como funciona este mercado. Tudo começa com o mangá. Apesar de algumas pessoas dizerem que mangá significa “figuras irresponsáveis”, para os grandes estudiosos e aficionados pelo assunto não existe nenhuma tradução especifica para a palavra, é apenas a palavra usada para denominar histórias em quadrinhos japonesas, assim como no Brasil chama-se HQ’S e nos EUA, comics.

Mangá é semelhante a cinema, existem vários gêneros para diferentes públicos, ação, aventura, policial, drama, épico, comédia, infantil, adulto, entre outros títulos que tomam conta das bancas de revistas. Para cada gênero os japoneses criaram uma denominação. Assim sendo, mangá masculino é Shonen mangá, e feminino é Shoujo mangá. Existem outras denominações mais especificas, como os de mangá adulto, onde Yaoi é mangá para homossexuais masculinos e Yuri é para homossexuais femininos. Tem para todos os gostos e estilos, ao contrario daquele ditado que diz que desenho é coisa para criança. Também, mas não só para criança. Abra sua mente.

Tudo funciona mais ou menos assim. Digamos que você seja um bom desenhista e roteirista, seja formado em alguma escola ou auto-ditada mesmo (No Japão existem varias escolas renomadas de mangá, que já formaram ótimos profissionais), aí você manda sua historia para alguma editora, ela se agrada do seu trabalho e lhe contrata. Assim surgem os diversos títulos, que são publicdos pelas editoras em diversas periodicidades, semanalmente, quinzenalmente, mensalmente e até semestralmente. Você pode comprar um mangá com mais de um titulo de série ou a versão de bolso, com apenas a sua série favorita. Por exemplo: você não precisa comprar um mangá com “Cavaleiros do Zodíaco”, “Dragon Ball” e “Sailor Moom” juntos, se você só gosta de “Sailor Moon”. Você pode simplesmente comprar a versão unitária só com o mangá que lhe agrada.

Se um mangá se destaca ele vira animê, ou seja, um estúdio compra os seus direitos para a produção de uma animação para TV. Se a série de TV se destaca ela ganha um longa metragem, especial para vídeo (mais conhecido como OVA – Original Vídeo Animation), ou mesmo uma nova série, fora as inúmeras bugigangas como brinquedos, roupas, gomas de mascar, mochilas e tudo mais que puder ser vendido para a molecada. É um mercado que abrange desde editoras até fabricas de brinquedos. Por exemplo, um anime como “Os Cavaleiros do Zodíaco” rendeu muito dinheiro com a venda de bonequinhos com armaduras, e a empresa que comprou os direitos do animê na época (no caso a Bandai), lucrou bastante.

Mas voltando ao Brasil...

A chegada dos cavaleiros do zodíaco trouxe uma série de outros animês, acarretando uma
verdadeira batalha pela audiência entre as emissoras Manchete e SBT. Era uma luta para ver quem conseguia comprar as melhores séries e assim ganhar mais pontos no ibope. Esta pode ser considerada a fase de ouro do mangá contemporâneo no Brasil, de 1994 a 1998. Nesta fase se destacaram as séries, "Pokémon", "Yuyu Hakusho" e o já citado "Os Cavaleiros do Zodíaco". Mais tarde, outras emissoras como a Band, Record e mesmo a conservadora Rede Globo também se renderam as animações japonesas, trazendo animes de sucesso para a telinha brasileira. Desta vez foram as continuações de 'Dragon Ball" (as versões Z e GT), "Samuray X" e "Digimom", que ganharam destaque.

Inúmeras revistas surgiram tratando do assunto, mas uma foi a grande responsável por consolidar de vez a cultura animê/mangá no Brasil, a revista Animax. Enquanto outras revistas falavam de vários segmentos de animação e tinham uma ou duas matérias sobre anime, a Animax era a única especializada em animação japonesa, que trazia ao seu leitor informações detalhadas sobre o que passava no Brasil e no Japão. Como mediadores e formadores de opinião sobre o assunto, seus idealizadores criticavam de forma profissional todo o trade do mangá, trazendo não só informação de qualidade, como reivindicações por melhorias na gestão do mangá no Brasil.

Com isso o fã de mangá e animê começou a lutar por melhores dublagens, publicações de revistas, incentivo ao artista local (desenhistas e roteiristas), produção de eventos, etc. Grupos começaram a se reunir criando fã-clubes organizados, com direito a carteirinha de sócio e até sorteios mensais de coleções de anime. Não demorou muito para surgirem grandes eventos como o Animecon, além da febre das publicações de mangás de sucesso por editoras brasileiras. Pronto, estava consolidado a cultura mangá no Brasil.

Hoje existem mais de 20 publicações semanais de mangá nas bancas, fora os amimes sendo exibidos tanto em canais abertos quanto em canais por assinatura, inúmeras revistas especializadas, eventos gigantescos nas principais capitais do país, sites, blogs, cursos de desenho e roteiro. Os Otakus podem sair livremente por aí em seus cosplayers (pessoas que se fantasiam e interpretam seus personagens favoritos em pleno dia a dia). Resumindo, não é apenas comemorado os 100 anos de imigração do povo japonês, como também os 14 anos da imigração de sua arte do mangá e do anime, que se enraíza cada vez mais na terra do carnaval. Um motivo a mais para fazer parte da comemoração.


Saiba mais

http://mangasjbc.uol.com.br/o-que-e-manga/

http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u363054.shtml

http://www.nippobrasil.com.br/2.semanal.manga/index.shtml

http://www.youtube.com/watch?v=qNwRKZC-Us8

http://www.aprendebrasil.com.br/reportagens/japao/cultura.asp

http://henshin.uol.com.br/2007/08/30/os-30-animes-dos-anos-90-que-deveriam-voltar-a-tv/